Amocha

Não há fome que não dê em fartura. Andava eu a queixar-me do pouco que havía para fazer, pois agora é uma correria, não há mãos a medir, e até já tivemos de ficar depois da hora para acabar algumas coisas com prazos. Tramado! Resta saber se isto se vai tornar um hábito ou se foi só por causa do avolumar do expediente. Ou se me vão compensar. Ou se nada. Eu sei que não estou em condições de regatear ou impor, mas pelo que me pagam e pelo que exigem, ainda mais em horário extra-laboral, só lhes ficava bem pagarem. Porque afinal, convenhamos: Isto é um contrato. Eu dou o meu trabalho, eles dão o dinheiro, é assim que funciona. Mas não posso abrir o bico ou lá me ponho em risco de novo e sei bem como está o mercado de empregos. É tudo uma tristeza, aproveitam-se desta maldita crise para explorarem toda a gente. Amocha. É o que digo para mim e sigo.
 

Uma pedra no sapato

Felizmente que o mês de Agosto acabou, toda a gente regressou ao escritório e já há o que fazer. Detesto estar a olhar para o ar e fazer de conta que estou ocupada, como o tempo demora a passar, já para não falar que não tenho jeitinho nenhum para disfarçar que o trabalho escasseia. Mais ainda que para mim, é um risco tremendo... Olha se acham que eu sou dispensável?! O J regressou animadíssimo e cheio de aventuras, muito bronzeado. E muito desligado. Se não fosse eu a telefonar, acho que ainda estava à espera para saber de tantas peripécias que me contou. Especialmente, envolvendo uma certa rapariga a quem se refere com especial relevo e especial entoação na voz. Perguntei quem era, mas para surpresa minha desviou o rumo da conversa não dando seguimento ao assunto, o que me deixou desconfiada. Porque razão não me há-de querer falar dos seus novos amigos, da sua nova amiga? Que estranho. Uma sensação incómoda deixou-me de pé atrás e depois daquele episódio, decidi que não ía ligar mais. Se quiser, ele que me procure. Não são ciúmes porque o que me liga a ele é verdadeira amizade, mas tenho uma séria dificuldade em confiar seja em quem for, e se ele foi o meu eleito, não consigo aceitar que eu não o seja para ele. O problema é meu, então eu afasto-me.