Adrenalina mais

O que me levou a largar a publicidade de porta em porta foi uma cena memorável. Poderão passar muitos anos que nunca na minha vida hei-se esquecer aquele fim de tarde. Estavamos todos cansados e aguardavamos apenas pelos dois últimos do nosso grupo para reunidos, metermo-nos na carrinha e regressarmos ao escritório. Era a volta de todos os dias. O telemóvel de um dos rapazes tocou. As interjeições dispararam e tudo a perguntar o que se passava. Era uma luta, uma batalha, uma guerra. Como assim? Dois grupos de heavy metal havíam-se encontrado e o confronto tinha sido inevitável. Os nossos retardatários pertencíam a um desses rivais e estavam em minoria. Não havía nada para pensar nem tempo a perder, corremos que nem uns loucos como se fossemos a infantaria. Até hoje não consigo perceber de onde apareceram tantos e em tão pouco tempo. Era uma enorme mancha negra em que os cintos e as correntes de metal reflectíam a luz do fim de dia, reluzentes, eu piscava os olhos e dava pontapés, socos, mordía braços, berrava, corría e atirava-me sem ver para onde. Havía papéis de publicidade espalhados e a esvoaçar, roupa rasgada, gente no chão, gente à janela. E de repente ouviu-se a sirene do carro da policia e em menos de nada toda a gente desapareceu. Alguém que eu nunca tinha visto, deu-me a mão e correu levando-me a reboque. Estivemos escondidos dentro de um caixote de lixo durante duas horas. Quando saímos pagou-me uma cerveja e bateu com o punho no meu ombro ao de leve. Era o inimigo.